Comissão da Verdade: Bolsonaro quer extinguir Comissão de Mortos da ditadura

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O presidente da Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos (CEMDP), Marco Vinícius Pereira de Carvalho, convocou uma reunião extraordinária para a próxima quarta-feira, 14, para a análise e votação da extinção do órgão. O governo Jair Bolsonaro propõe a finalização dos trabalhos do colegiado responsável por tratar de crimes cometidos durante a ditadura militar a menos de um mês da posse do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva.

Órgão recuou da primeira investida em junho após contestação do MPF

O Estadão revelou em junho deste ano, já estava nos planos da atual gestão federal encerrar os trabalhos da CEMDP. O órgão, no entanto, recuou da iniciativa. Após 27 anos de investigação, poucos corpos ainda foram localizados. A decisão de extinguir o colegiado foi adiada no fim daquele mesmo mês após contestação da Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC) e do Ministério Público Federal (MPF).

Dimas Antonio Casemiro foi torturado e morto em 1971; o corpo dele foi encontrado em uma vala clandestina pelo Grupo de Trabalho Perus, em 2018.
Dimas Antonio Casemiro foi torturado e morto em 1971; o corpo dele foi encontrado em uma vala clandestina pelo Grupo de Trabalho Perus, em 2018. Foto: Acervo da Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos

O ex-presidente da Comissão Nacional da Verdade Paulo Abrão disse acreditar que a medida busca gerar desconfortos, sobretudo no período de transição de gestão federal. “Isso (a convocação) tem cheiro do núcleo ideológico do governo querendo gerar algum tipo de intriga ou alguma polêmica totalmente desnecessária no apagar das luzes do governo”, afirmou. A iniciativa pode embaraçar ainda mais a relação de Lula com os militares e intensificar constrangimentos para o presidente eleito.

Segundo Abrão, que também é ex-secretário-executivo da Comissão Interamericana dos Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA), a finalização dos trabalhos é “incabível”. “Estamos falando de crimes cuja reivindicação de reparação é imprescritível de acordo com as normas internacionais das quais o Brasil tem o dever de seguir”, disse.

Familiares do operário Manoel Fiel Filho assistem à Conferência Internacional sobre o Direito à Verdade, no auditório da Escola Politécnica da USP.
Familiares do operário Manoel Fiel Filho assistem à Conferência Internacional sobre o Direito à Verdade, no auditório da Escola Politécnica da USP. Foto: Sergio Castro/Estadão – 20/10/2009

Fundada em 1995 no governo Fernando Henrique Cardoso (PSDB), a comissão foi o resultado de um acordo entre o ministro da Justiça, Nelson Jobim, e o ministro do Exército, Zenildo Lucena. Tratava-se de cumprir o que estava nas disposições transitórias da Constituição de 1988, reconhecendo a responsabilidade do Estado brasileiro no desaparecimento e na morte de presos políticos. Ao mesmo tempo, mantinha-se a Lei de Anistia, de 1979, que impedia a punição dos torturadores e assassinos de prisioneiros sob custódia.

Ao longo do trabalho da comissão, surgiram relatos de militares e de policiais, além de documentos, que ajudaram a esclarecer dezenas de crimes, como o sequestro, a tortura, a morte e o desaparecimento do ex-deputado federal Rubens Paiva. Também foi possível identificar na vala comum do Cemitério de Perus, em São Paulo, as ossadas de cinco desaparecidos políticos: Dênis Casemiro, Frederico Antonio Mayr, Flávio de Carvalho Molina, Dimas Antonio Casemiro e Aluísio Palhano Ferreira.

 

 

Fonte: Agência Estado

 

 

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